sábado, 2 de outubro de 2010

Um segredo básico para passar.

Se existe alguém que entende de vestibular é o paulista no Vinícius Cifú Lopes, 18. Encarou a Fuvest aos 13 anos, na 7ª série, e passou na primeira fase. A partir da 8ª, foi aprovado todos os anos como treineiro. Agora ele conquista o primeiro lugar na Fuvest.
O segredo, diz, é o básico: "prestar atenção nas aulas".
ENTREVISTA COM VINÍCIOS
Folha - O que você acha que foi determinante para conseguir essa façanha no vestibular?
Vinícius - Eu nunca fui de conversar em aula. E isso é importante, porque ou você ouve o professor ou ouve seu amigo.
Folha - Isso porque você acha legal o que o professor está falando ali na frente? Ou é por respeito ou hábito?
Vinícius - Hábito e respeito também. E eu nunca deixei acumular as coisas. Tem gente que deixa tudo pra última hora. Pra que economia de esforço? Então, vai fazendo à medida que vem a lição, à medida que vêm as aulas, vai fazendo...
Folha - Nunca deixar para amanhã o que dá para fazer hoje...
Vinícius - Porque amanhã pode acontecer alguma outra coisa e não dar tempo.
Folha - Você desenvolveu algum método de estudo para o vestibular?
Vinícius - Não, porque encarei o colegial me preparando para a vida.
Folha - Como assim?
Vinícius - Por exemplo, eu aprendi biologia pra não ser enganado por nenhum médico. Porque você está num colégio aprendendo tudo aquilo pra uma finalidade. E a finalidade do ensino nunca foi o vestibular. Eu só estudava isso para a vida, para não ser um ignorante. E aí o vestibular veio como consequência.
Folha - Mas aí você foi o primeiro do Enem também?
Vinícius - Fui o primeiro do Enem. Nem foi fácil, estava doente no dia. Tinha dor de cabeça, gripe, tive que pegar táxi, almocei muito cedo para chegar na hora. Comecei a prova e pensei "não vai dar pé porque aqui estou com metade da minha capacidade".
Folha - Tudo o que você faz é assim, sempre com muita consciência, ou é só com os estudos?
Vinícius - Com tudo, não gosto de perder o controle sobre o que eu faço.
Folha - E dá pra ter controle de tudo? Nas relações pessoais, nas amizades...? Vinícius - Dá. A gente tem que ficar atento se a pessoa é uma amiga de verdade ou se também não vale nada, está só te sugando.
Folha - Você lê muito?
Vinícius - Nestes anos de provas, a única coisa que eu li, fora os livros da Fuvest, foi jornal.
Folha - E TV, você assiste?
Vinícius - Só os noticiários. Assisto o do Bóris Casoy e o "Jornal Nacional" porque os dois separados são duas coisas horríveis. Então, é preciso juntar os dois para conseguir algo útil. Porque um faz muito comentário infantil, o outro só mostra baboseira, o que não interessa.
Folha - Qual é o comentário infantil?
Vinícius - O do Boris. "Isso é uma vergonha." Fica toda hora falando que é uma vergonha. Mas sugere alguma coisa? Não sugere nada. E o "Jornal Nacional" mostra o cara que está lá dentro do sertão costurando piaçava. Eu estou querendo saber disso? Então tenho que assistir os dois pra ter uma idéia.
Folha - Como você acha que a maioria dos estudantes de classe média, como os do Objetivo, onde você estudou, encara o ensino, o conhecimento?
Vinícius - Com repúdio. A grande maioria dos meus colegas pensa: "Ah, estudar não serve pra nada, amanhã tem festa, depois de amanha tem festa e tem a Copa também". Eu era de uma classe de 60 alunos, 40 eram assim.
Folha - E você acha que isso é consequência da baixa qualidade do ensino básico, que não soube conquistar esses estudantes?
Vinícius - Não, a culpa mesmo é dos pais, porque não ensinaram o cara durante o ensino fundamental a prestar atenção. Aí, chega ao ensino médio e o pai está desesperado, mandando o filho prestar atenção na aula. Vai adiantar? Ele não sabe como fazer isso.
Folha - E com você, como foi?
Vinícius - Os meus pais me orientaram bem, eu tomei o hábito e pronto.
Folha - E namorada?
Vinícius - Não apareceu.
Folha - Você curte música?
Vinícius - Não, não curto música. Eu gosto de silêncio.
Folha - Nem música brasileira?
Vinícius - Menos ainda. Música brasileira sempre foi nacionalista, contextual. Muita gente acha que eu gosto de música clássica, mas eu não gosto.
Folha - Você segue alguma religião?
Vinícius - Não.
Folha- Tudo o que não é explicado matematicamente você não acredita?
Vinícius - Não. Mesmo porque tem um monte de fenômenos que o povo faz um grande auê em cima. O negócio da morte, viajar pela morte e tal, é tudo explicável cientificamente. E não que eu siga a ciência como uma filosofia, uma religião. Eu não acredito em anjo, em duende, em superstição. Acredito que, às vezes, o medo comum ou a vontade comum tem influência, mas é disposição psicológica.
Folha - Já conheceu os veteranos da faculdade?
Vinícius - Conheci. Foi tudo bem. Lá na matemática não tem piscina, então, não tem massa d'água pra se afogar. Não tem árvores pra pendurar corda. E também estava cheio de pais por lá.
(por Bell Kranz Editora do Folhateen – Folha de São Paulo de 14/2/2000)

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